Reconhecemos o fim nas palavras que dizíamos e agora ficam soltas pelo vento ou escondidas no pensamento, sabemos o desenho do fim pelos gestos que o fazem adivinhar, choramos o fim logo que a vida nos diz sussurrando uma determinada palavra.
Somos instinto, em que as presenças e ausências dos cheiros, dos olhares, das palavras nos entregam em papel carimbado...o fim. Nós, os que não sei quantificar, qualificamos na hora exacta a partida da gaivota que com que ela leva parte de nós.
Os tantos fins que vamos tendo ao longo da vida. Os que nos acordam a meio da noite, os que não nos deixam sequer chegar a dormir, os que nos fazem sentar num café ao pé de um amigo horas a fio…tantos os fins, tão poucos os meios para que alguns desses fins não tivessem acontecido. Escaparam-nos, saíram-nos da pele, afogaram-nos.
Mas os fins inesperados são os que nos mais maltratam, nos rasgam a roupa, nos cegam os horizontes e queimam o passado. Ficamos assim sem presente. Não nos deixam nada, absolutamente nada. Nem uma resposta.
Nesta pequenina, suave, intensa cidade que é o nosso coração somos ainda assim enganados pelos semáforos, enganados pelo peão que passa e não passa, pelo papel que voa pela janela e não é para nós. Ultrapassam-nos dentro desta nossa pequena cidade com algumas curvas e poucas rectas. Estacionamos nesta cidade mas rapidamente nos dizem que já não temos lugar e que fomos e já não somos mais do éramos. Cidadezinha, esta, em que as regras mal existem e que continuamente são renovadas as leis do amor. Desta cidade coração, de rios que correm e pontes que às vezes quebram, que às vezes se reconstroem nascem desejos, enamoramentos, paixões, atracções. E se já me disseram que afinal não é cidade, que afinal é sonho? Sim. Disseram-me ser aldeia de poucos habitantes, de visitas de passagem, de histórias com passado, de quase terreno para turismo rural. Mas acredito, por mais que seja sonho, ser cidade, escolho ser assim…como as cidades dignas de romance histórico, de canção em sua honra, de poema bem ou mal rimado, de retrato de ter em casa mesmo que lá nunca tenhamos estado.
Como se eu mandasse nas palavras
Pediram-me que a dôr fosse um sorriso
Como se eu mandasse nas palavras
Disseram-me ser louca sem juízo
Como se eu mandasse nas palavras
Falaram-me qua a água era o deserto
Como se eu mandasse nas palavras
Disseram ser o mesmo, o longe e o perto
Palavras não são só aquilo que eu oiço
Não peçam que eu lhes ganhe ou não as sinta
Palavras são demais para o que posso
Não peçam que eu as vença ou que lhes minta
Como se eu mandasse nas palavras
Quiseram que trocasse sol por lua
Como se eu mandasse nas palavras
Disseram que amar-te era ser tua
Como se eu mandasse nas palavras
Queriam que emendasse o que está escrito
Como se eu mandasse nas palavras
Daria agora o dito por não dito
Se percebes as reticências de um outro amor, as reticências de um avanço demasiado avançado, de um recuo demasiado recuado…e quiçá esquecido ou perdido ou apagado do livro daquela feira barata com descontos de verão…pois que se soubesses a metade da laranja, talvez não a quisesses por inteiro. pois que se soubesses o começo do livro nunca o comprarias mesmo que barato. pois que é na volta, destas voltas que dou, de mais um texto mais um talvez, mais um…outra vez.
As reticências que duram dias mais do que noites…às vezes de mais uma noite em que quase, era quase certa…as coisas…aquelas coisas que não consigo dar ou ter ou pedir explicação. Que se houvesse um dicionário dessas coisas seria toda uma simples declaração dessas mesmas coisas.
Fico-me, sem data marcada, nas reticências. Porque há tanto mas tanto que nestes pontos dizem tudo…
E qualquer uma das nossas primeiras impressões foi chegada que nos deu a partida para partir lado a lado.
Foi partilhando os mesmos comprimidos que não chegaram (vencidos) para aguentar todos os dias que ainda tínhamos, e afinal, temos para nos vermos vencer.
Agora, e mesmo na hora em que falamos, mesmo na hora em que nos mudamos, mesmo no tudo ao mesmo tempo que nos embrulha o olhar…relampejam assim os desejos de ser, os erros deixados para trás…e acabamos ou começamos assim como um estrangeiro a amar de uma outra maneira, a estrangeirar o sonho de um dia sermos assim.
histórias que tem nome de gente, que tive contigo. histórias em que há dias que marcam, que esquecem...o balanço do arco do teu vestido, os passos da rua tratada e da molhada avenida.
e eis que história é saudade, ritmo novo de caminho...a coisas de saudade, a coisas de gente que fica na história.